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O que parecia apenas a morte de um pé de maracujá se transformou em reflexões sobre luto, perda e recomeço. Essas reflexões se materializaram nas páginas de uma obra literária, escrita pelo jornalista e psicólogo egresso da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) Luiz Osete. O livro ‘Maracujá Interrompida’, obra de estreia do autor, conquistou o Prêmio Jabuti 2025 na categoria Escritor Estreante em Poesia, no eixo Inovação. Lançada pela Companhia Editora de Pernambuco (Cepe), a obra retrata o luto de uma filha após a morte da mãe, reunindo poemas que exploram a experiência da perda e a dor das memórias. O anúncio da premiação ocorreu na noite da última segunda-feira (27).
A história foi inspirada nos relatos ouvidos pelo autor durante o período de estágio, enquanto cursava Psicologia na Univasf. No livro de Osete, a protagonista vivencia os conflitos do luto, enquanto enfrenta a convivência com o pai, que no passado foi abusivo e agressivo com a ela e com a mãe e agora sofre de demência. A obra já havia conquistado o Prêmio Hermilo Borba Filho de Literatura 2024, promovido pela Secretaria de Cultura de Pernambuco em parceria com a Cepe.
Natural de Cardeal da Silva (BA), Osete chegou ao Vale do São Francisco em 2005 para cursar Jornalismo em Multimeios na Universidade do Estado da Bahia (Uneb), em Juazeiro. Mais tarde, iniciou a graduação em Psicologia na Univasf, onde, em 2013, começou o estágio no Núcleo de Apoio à Saúde da Família (Nasf), no bairro Dom Avelar, em Petrolina (PE). Na época, teve contato com diversas histórias de mulheres que marcaram sua trajetória.
Durante a pandemia, Osete passou um tempo na casa dos pais em Cardeal da Silva. Um dia, o escritor se deparou com o pé de maracujá do quintal da casa, que costumava contemplar, cortado. “Senti uma tristeza profunda, mas não reclamei, não disse nada. Continuei indo ao quintal, observando o que acontecia com aquele pé morto, registrando o que via e sentia”, recorda.
A cena despertou lembranças do estágio e das mulheres que conheceu naquele período. “Foi nesse contexto que algumas histórias voltaram, sobretudo as das mulheres que atendi na atenção básica, muitas delas vítimas de violência doméstica. Elas reapareceram com força e pediram passagem, me ensinando sobre afeto, coragem e tantas outras coisas inomináveis, mas profundamente necessárias”, conta Osete.
Foi dessas experiências que também surgiu o título do livro. Segundo o autor, ‘Maracujá Interrompida’ nasceu da fusão entre duas imagens centrais: o pé de maracujá morto e a figura da mãe, que inspira o processo de elaboração do luto vivido pelo eu lírico do livro.
Ao lembrar a época de graduação e estágio, Osete reforçou a importância da experiência em psicologia para sua escrita. “Além das partilhas feitas junto à equipe de estágio, conduzida com sensibilidade e rigor pela professora Bárbara Cabral, encontrei na escrita uma forma de elaborar tudo aquilo, de transformar o sofrimento em palavra, de criar um espaço simbólico onde aquelas vozes pudessem continuar existindo, ainda que de outro modo. Foi ali que começou o processo que, anos depois, culminou em ‘Maracujá Interrompida’”, relembra.

Osete é jornalista no Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE), cargo que ocupa desde 2012, e atualmente cursa doutorado em Educação, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Ele faz parte do grupo de pesquisa Kékeré, às margens do Rio São Francisco, campo de ações com crianças.
“Sinto-me honrado por poder representar o Vale do São Francisco nesse prêmio, que tem tanta importância para a literatura brasileira. É bonito pensar que histórias nascidas da escuta e do cuidado, no contexto da atenção básica em psicologia, possam agora atravessar outros caminhos e alcançar outras pessoas”, diz o escritor sobre a premiação.
A obra 'Maracujá Interrompida' está disponível na Livraria Cepe e nas principais livrarias on-line.
Jabuti - O Prêmio Jabuti foi criado em 1959 pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), para celebrar e reconhecer autores, editores e outros profissionais do mercado editorial. O Jabuti já foi concedido ao professor do Colegiado de Ciências Biológicas da Univasf José Alves de Siqueira Filho, organizador do livro ‘Flora das Caatingas do Rio São Francisco’. A obra venceu o Prêmio Jabuti de Ciências Naturais, em 2013. O livro ilustrado, que apresenta a diversidade da Caatinga, reúne em suas mais de 515 páginas a produção científica desenvolvida no Centro de Referência para Recuperação de Áreas Degradadas das Caatingas (Crad) da Univasf e de pesquisadores de 39 instituições. A publicação da obra contou, à época, com o apoio financeiro do Ministério da Integração Nacional.